Dentro do ambiente de áudio é muito comum a situação onde no meio de um monte de tracks tocando a gente deseja momentaneamente escutar só um deles . É isso o que se chama SOLO.
A palavra vem do italiano , como a maioria dos termos usados em música, e significa “sozinho”. Ou seja, quando se aperta o botão “S” , ou qualquer que seja o nome usado pela DAW ou console, escutamos apenas aquele track.
Até aí , não há muita novidade. Mas vamos agora conhecer as diferentes possibilidades dessa função, e como podemos usá-las em nosso benefício.
- Primeiro, o Botão
As DAWs são evoluções (ou adaptações) dos consoles analógicos, pelo menos em sua base filosófica. Então precisamos ver como as coisas aconteciam antes dos computadores. É importante ressaltar que nem todos os consoles oferecem todas as possibilidades que vamos estudar. O limite é o custo envolvido. Quanto mais possibilidades de solos, mais caro o console.
Obviamente os consoles oferecem a possibilidade de se efetuar um solo, e a primeira característica importante é que os botões podem ser projetados pelo fabricante para serem com ou sem trava (latch ou momentary). Existem alguns casos, que veremos mais adiante, em que o solo é uma coisa que queremos apenas enquanto pressionamos o botão. Esse é o caso Momentary – o solo acontece só enquanto o botão está pressionado. Em outros, o botão é do tipo Latch – uma vez apertado, permanece apertado até ser pressionado de novo. Essa é a condição default de praticamente toda DAW.
- Uma Questão de Geografia
Todo o mecanismo de um circuito de solo se baseia no caminho do sinal. O resultado de um solo é conseguirmos escutar apenas um track, mas isso pode ser feito de algumas maneiras diferentes.
Começando pelo jeito mais simples e mais barato em termos de hardware, temos o chamado:
PFL – Pre Fader Listen – nesse tipo de solo, todos os tracks continuam tocando normalmente, indo para seus respectivos destinos, inclusive o master fader. Mas no console nós deixamos de escutar a informação que vem do master e passamos a ouvir o que vem de um outro Bus – o Bus de solo.
A mecânica é: ao apertar um dos botões de PFL , o sinal do track é enviado para o Bus de Solo, e este é conectado à saída de monitoração da sala. Ou seja, nada é afetado nos tracks. Se a gente estava mandando uma mix para um gravador externo, esse continuaria gravando o master. Nós é que estaríamos ouvindo apenas um track.
Por exemplo, seria um jeito de solar a voz do cantor enquanto ele está gravando, sem prejudicar o que ele ouve nos fones.
Na figura acima, quando se aperta o botão de PFL de qualquer track, o som do track é enviado ao Solo Bus, a chave rebate de A para B e o que se ouve nas caixas é o Solo Bus.
Mas nem tudo são flores. Repare que existe uma característica fundamental no PFL. Ele parte de um ponto do circuito (ou do software) ANTES de chegar no fader e no PAN (daí o nome PRE-FADER). Isso pode ser problemático, porque vejamos o caso de uma guitarra que foi gravada bem alto e que por isso estamos monitorando com o fader em -24dB. Ao apertar o PFL no track de guitarra, estaremos subitamente aumentando 24dB no volume!!!! Isso pode ser bem desagradável, e daí o apelido que os americanos dão ao PFL de “Pretty F@#$% Loud”. Por causa disso, normalmente existe um controle de volume master para o Solo Bus.
Em vários projetos de console, o ponto de saída do PFL pode ser ainda antes do equalizador , das mandadas de fones e efeitos e do insert point (numa DAW pode ser antes dos plugins ).
Resumindo, o PFL é útil quando desejamos solar um track e não afetar o que é mandado para o master fader e ouvir o sinal como ele é antes de passar no fader e pan.
OBS – a filosofia de se puxar um sinal pre-fader também vai ser útil para fazer fones com equilíbrios diferentes da nossa mix e para mandadas de sidechain. Mas estas não são aplicações especificamente de solos.
AFL – After Fader Listen – agora o ponto de onde o sinal do track é mandado para a monitoração se situa depois do fader e pan. Com isso, temos um solo que obedece ao volume do fader e ao mesmo tempo obedece ao posicionamento do estéreo, permitindo uma melhor avaliação da função do track na mix.
Na figura acima, o track solado é enviado à monitoração após fader e pan, e também não afeta o que está saindo pelo master.
Em termos de projeto e custo, o AFL é um sistema um pouco mais complicado de executar, pois o bus de solo passa a ser estéreo. Normalmente em consoles e DAWs , nos são oferecidas as duas opções de solo – PFL e/ou AFL, muitas vezes em botões separados e outras em um selecionador master para todo o console/DAW.
SIP – Solo In Place – antes da gente ter falado aqui desse chaveamento do sinal que vai para as caixas, uma maneira mais simples filosoficamente falando de se pensar como executar um solo é justamente se mutar todos os tracks, MENOS o que desejamos ouvir.
Esse é um jeito mentalmente óbvio mas fisicamente complicado. Isso porque agora nós não vamos atuar apenas no canal solado, mas em todos os outros, através de algum tipo de controle de chaveamento. Ou seja, ao apertar o botão de solo em um track, eu tenho que ser capaz de mutar automaticamente todos os outros tracks. Em termos de consoles analógicos, apenas os mais caros apresentam essa função – ou pelo menos os que permitem automatizar os botões de mute.
A coisa mais importante do SIP é que esse solo agora afeta o que vai para o master fader. Se você estava fazendo uma master ao vivo para um gravador externo, ela foi afetada. Então há que se ter um certo cuidado.
Para quem só trabalhou com DAWs, o SIP é a situação mais comum de solo (no Pro Tools é o modo default). Isso porque para se usar AFL/PFL eu preciso ser capaz de externamente mandar o sinal para as caixas a partir de outras saídas da interface. A chave A/B não existe, e nós é que temos de dar um jeito de fazer o chaveamento por fora do computador/interface. Isso pode ser feito ligando-se as saídas a um pequeno console externo ou mesmo a um controlador de monitoração.
Na figura acima, a chave A/B não está na DAW, e deve ser feita por nós externamente, via um console ou através de um seletor de monitoração.
- Funções Adicionais
Solo Safe – Muitas vezes é útil que possamos isolar a função solo em alguns canais. Um reverb, por exemplo. Normalmente nós usamos um track de reverb como Safe. Assim, quando solamos um track, o reverb continua tocando e podemos ouvir como o track soa com seu reverb.
Outra utilidade é colocar um master de grupo como Solo Safe. Assim, quando solamos (via SIP) um track de caixa de bateria, por exemplo, o master do grupo de bateria não é desligado. Não fosse assim, ao solarmos SIP a caixa, o master de grupo de bateria seria mutado e não ouviríamos nada.
Embora o solo safe seja muito comum em DAWs, ele está presente apenas nos consoles físicos mais sofisticados, porque depende do controle remoto dos mutes de todos os canais, característico do SIP.
Solo Groups – Normalmente essa função não é exclusiva dos solos, sendo selecionada a partir da configuração de grupos da DAW. O que vemos é uma página em que dizemos se para um determinado grupo (ou mesmo para todos os grupos), os solos devem fazer parte.
Qualquer que seja o jeito de configurar, a possibilidade de agrupar solos é muito útil em uma mixagem, e se a DAW dispuser de uma seleção de agrupamento exclusivo de solos, é bom descobrir como fazer.
XOR – O que é XOR?
Mais uma possibilidade de solo que aumenta muito a praticidade. Antes vamos rapidamente ver o porquê desse nome estranho.
Em lógica e eletrônica digital, temos algumas funções básicas, como AND e OR . Se temos um circuito AND com duas entradas, se pelo menos uma delas for zero, a saída é zero. Em um circuito tipo OR, se pelo menos uma das entradas for 1 , a saída é 1.
Porém existe o caso em que só se as duas entradas forem diferentes ( 0 e 1 ou 1 e 0), a saída é 1. Esse tipo de circuito, onde a saída é 1 se apenas uma entrada for 1 , é chamado Exclusive-Or (OU-EXCLUSIVO) e abreviado para XOR.
O Pro Tools , em analogia a esse tipo de circuito, chama de XOR o solo onde APENAS 1 track está solado de cada vez. Se a gente está com um track em solo e sola outro, o primeiro solo desliga.
Essa função é extremamente útil quando se quer, por exemplo, comparar dois tracks, porque permite a mudança rápida entre eles.
- Concluindo
A facilidade de trabalho nas DAWs acaba nos desligando um pouco das possibilidades dessas diferentes filosofias de solo, mas é muito importante conhecê-las, para aumentar a velocidade do trabalho e permitir maiores recursos de mixagem. Procure esmiuçar como sua DAW faz os solos. Isso pode economizar muitas horas e trazer melhores resultados.
Muito bom, professor! Obrigado.